Gregory Haertel: um talentoso psiquiatra apaixonado pela arte de escrever

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Por Claus Jensen

O nome Gregory Haertel está presente em várias peças de teatro, poesias e três livros. Muitas pessoas nem imaginam que esse talentoso autor de 42 anos é psiquiatra. Casado com a cantora Mareike Valentin, suas letras estão presentes em várias músicas interpretadas por ela.

Neste mês Gregory lançou seu segundo romance, A Casa Antiga, que passa em Aguardo. Apesar de ser uma continuação do livro anterior cujo título é o nome da cidade fictícia, as duas não tem nenhuma relação temporal ou de história, a não ser pelo fato de acontecerem em um período de enchente.

Esse é terceiro livro publicado do autor que mora em Blumenau. O primeiro foi uma coletânea de contos. Conversamos com Gregory nas instalações de OBlumenauense, sobre o livro e seu processo criativo na hora de escrever.

capa-casa_antigaOBlumenauense: Quanto tempo demorou para escrever Casa Antiga e como foi esse processo?

Gregory Haertel: Nos dois romances, mentalizei as ideias durante um certo tempo, até que chegou o momento de parar e escrever. Às vezes eu começo o primeiro capítulo em casa, mas daí sinto a necessidade de parar tudo que faço e me dedicar exclusivamente a ele.

Para escrever Casa Antiga, fui para Corupá onde fiquei sozinho por cerca de 20 dias. Acordava às 7h e escrevia das 8h ao meio dia, almoçava, retomava das 14h às 18h, depois revisava o que tinha escrito. Era um trabalho. Depois desse tempo, o livro estava praticamente pronto, mas ainda faltavam os últimos capítulos, revisar e mudar algumas coisas. Esse trabalho é o mais longo, que é de organizar, fazer ajustes nos excessos e pode demorar mais de um ano.

OBlumenauense: Qual a parte mais prazerosa e incômoda na hora de escrever em todo o processo, sem a parte de revisão?

Gregory Haertel: A parte mais prazerosa é estar escrevendo mesmo. Apesar de ser cansativo, intenso e desgastante, gosto de ritmar o texto, pensar na ordem das palavras. Já a mais incômoda e necessária, é me distanciar de tudo e todos. Porque eu saio de minha rotina, me distancio das pessoas que eu gosto, do meu futebol e do trabalho para me dedicar exclusivamente. É algo que não vou ganhar nada, porque fecho o consultório e tenho gastos no lugar que estou. Mas sinto que é necessário.

OBlumenauense: Qual foi a inspiração do nome da cidade fictícia de Aguardo, que foi título do primeiro romance?

Gregory Haertel: Na época estava trocando e-mails com um amigo meu, o Arno, que fazia parte da Cia Carona de teatro e no final sempre colocavámos “então aguardo”. Então pensei: Aguardo é um nome legal para um livro, até porque tem a ideia da espera. A cidade tem características muito parecidas com Blumenau, como o fato de ser atravessada por um rio e periodicamente ter enchentes, que mobilizam as pessoas. Não é uma Blumenau atual e sim de 50 anos atrás, com um povoado menor. Mas para mim, Aguardo é Blumenau.

OBlumenauense: O livro relata um morador que perde sua esposa durante a enchente. Como acontece isso?

Gregory Haertel: Começa com o casal em uma casa, onde tem um sótão. A esposa morre logo nas primeiras páginas e as águas da enchente estão começando a baixar. Depois tem a trajetória do homem levando o corpo dela pela cidade no final das cheias, sem uma finalidade definida. Ele não sabe porque, apenas que tem que levar aquele corpo. Durante o trajeto ele vai lembrando, com uma narrativa muitas vezes no presente, das situações do passado, desde o início da enchente e toda a situação de vida desse casal. Mas como memória, não como um fato presente.

OBlumenauense: Porque você decidiu trabalhar no texto a memória do relacionamento entre os dois e não o fato que acontecia, no caso suas dificuldades durante essa enchente?

Gregory Haertel: Então, não sei [risos]. Foi uma linha de criação que veio e eu segui. Normalmente quando eu começo a escrever, nunca penso aonde que o livro vai chegar e nem porque estou escrevendo. Apenas vou registrando. Sempre falo que escrevo sobre coisas minhas, não fatos reais, mas através dos sentimentos. Talvez coisas que passei ou tenham a ver com minha vida.

Quando comecei a escrever sobre essa questão da personagem morrendo e a situação de enchente, surgiu a ideia dessa travessia do personagem com o corpo da esposa. Eu brinco que é uma história de amor e se libertar de uma relação e do corpo da mulher. Agora porque veio a ideia, eu não sei.

OBlumenauense: Seu trabalho é muito conhecido pelas letras de músicas, peças de teatro e poesias. Escrever um livro de romance é uma fase ou um objetivo alcançado?

Gregory Haertel: Eu comecei escrevendo contos, depois teatro e a música veio a partir disso. Mas a miinha base é a escrita literária. Quando o pessoal da Cia Carona de teatro leu meus contos, me chamou para escrever algumas peças e eu comecei a gostar. Tive a sorte das pessoas gostarem também, daí fui chamado para escrever outras. O primeiro romance surgiu logo após essa primeira peça, mas a minha narrativa é literária. O resto foi surgindo por trabalhar com a palavra.

OBlumenauense: Como foi o resultado das vendas dos outros livros?

Gregory Haertel: O romance Aguardo, foi viabilizado em Blumenau através do Fundo Municipal de Apoio a Cultura, como foi o caso de Casa Antiga também. Na época foi lançado pela Editora Nova Letra, que eu acabei distribuindo ou vendendo, mas ficou muito localizado por aqui. Muitas pessoas que leram, gostaram muito do livro.

Por causa de “Aguardo”, fui chamado para participar de algumas feiras como o Festival Nacional do Conto em Florianópolis. O Godofredo Oliveira Neto do Rio de Janeiro leu e também gostou muito do livro. Nunca tivemos como objetivo a venda, tanto que o fundo municipal pagou a edição. Não há a ambição de vender e ganhar dinheiro ou ter sucesso editorial. Uma nova edição do livro Casa Antiga vai sair através da Editora da Casa, de Jaraguá do Sul, do Carlos Henrique Schroeder. Com isso a obra vai ficar menos regionalizada.

OBlumenauense: Nunca pensou em mandar suas obras para uma grande editora nacional?

Gregory Haertel: Eu tinha mandado alguns contos há uns 10 ou 15 anos atrás. Mas sempre tive a impressão de que esse material deve chegar nas editoras, e se você não tem alguém que indica ou fala com a pessoa certa, não é lido. E segundo, porque para mim o livro faz muito mais sentido quando eu escrevo, do que o fato de ser publicado. Isso é uma consequência. Casa Antiga já foi escrito há uns 3 anos e alguns me perguntaram porque eu não publiquei antes. Sempre respondi que para mim estava pronto e eu gosto mesmo é de escrever.

OBlumenauense: O fato de ser psiquiatra e lidar com os conflitos existenciais, ajuda a inspirar na hora de escrever romances?

Gregory Haertel: A psiquiatra trata mais da parte clínica, que é a administração de tratamento medicamentoso como por exemplo na depressão e ansiedade. São consultas médicas, mais breves e menos aprofundadas nos dramas. Não faço a terapia, essa sim acaba aprofundando-se mais nas questões existenciais. Talvez o meu interesse em escrever e a psiquiatria tenham uma raiz comum pelo interesse nos dramas internos do ser humano. Mas nunca há relação com casos clínicos.

OBlumenauense: Como esse livro foi escrito há três anos, já existe outro em projeto?

Gregory Haertel: Sim, tem um que estou pensando há algum tempo e é possível eu parar novamente para escrever. Na nova obra, pode ter uma ligação entre texto e música composta, mas ainda está tudo meio “bagunçado” na cabeça.

 

A Casa Antiga | Gregory Haertel | Editora Da Casa | Valor: R$ 29,00

 

Mareike Valentin, Claus Jensen e Gregory Haertel
Mareike Valentin, Claus Jensen e Gregory Haertel