Nos últimos quatro anos, a Vara Criminal de Camboriú registrou um número expressivo de mulheres que solicitaram a retirada das medidas protetivas concedidas pela Justiça. Não só isso, mas da representação contra o agressor feita na delegacia de polícia.
O pedido, conhecido como retratação, acontece poucos dias depois do registro da ocorrência. Ou seja, essas mulheres voltaram atrás e as denúncias acabaram sendo arquivados.
Por que isso acontece? Esse índice pode ser considerado alto? Trata-se de um retrato só registrado em Camboriú ou acontece nas outras comarcas do Estado?
Essas perguntas motivaram uma pesquisa minuciosa, desenvolvida pela servidora Bruna Pereira, chefe do cartório naquela comarca. O estudo de caso virou uma dissertação, defendida e aprovada na segunda-feira, dia 1º de março, no mestrado profissional em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Bruna acredita que este cenário não é diferente do resto do Estado.
Foram analisadas 484 medidas protetivas em quatro períodos distintos, que ocorreram entre 2016 e 2020. A partir dos boletins de ocorrência e dos termos de audiência, ela constatou que 89,8% dos casos eram relacionamentos heterossexuais e envolviam maridos, companheiros e namorados antigos ou atuais.
O índice de retratação, no primeiro período analisado, foi de 33,33%. No segundo período chegou a 38,46%, e no terceiro pulou para 44,55%. No último período, da pandemia, reduziu para 2,33%. Na média, um terço das mulheres volta atrás após oficializar suas denúncias contra os agressores.
De acordo com Bruna, “nas possíveis causas da retratação estão o medo, o sentimento de culpa, a falta de recursos financeiros e a preocupação com os filhos”. Essas retratações, segundo ela, estariam associadas “ao fenômeno complexo da violência de forma direta (provocada pela condição da mulher agredida), indireta (advinda de outras relações afetivo-sociais), institucional (pelas omissões do Sistema de Justiça) e estrutural (pelos simbolismos presentes em nossa sociedade do que seria o papel de mulher e o papel de homem, considerando-se uma perspectiva heterossexual)”.
A dissertação foi orientada pela professora Grazielly Alessandra Baggenstoss. Além dela, a banca foi composta pelos professores Clarindo Epaminondas de Sá Neto e Caroline Medeiros Bahia.
Fonte: Tribunal de Justiça de SC