Por Urda Alice Klueger | Escritora, historiadora e doutora em Geografia
Oi, Katty!
Hoje de tarde fiquei pensando que deveria lhe escrever. Foi quando a gente estava voltando para casa e eu fiquei lembrando em tudo o que havia acontecido. A gente ir passear três vezes por dia na praia é rotina – sabemos os horários, os trajetos, os cheiros que poderão haver por lá – basta a Urda pegar a bolsa dos cachorros (onde, dentre outras coisas, há a minha capa vermelha para chuva) mais a corrente da Tereza Batista, e já saímos correndo para o portão.
Algumas vezes ela não pega a corrente da Tereza, e então essa cachorrona que agora faz parte da minha família fica meio murcha, o rabo caído, pois já entende que não irá junto. Nessas ocasiões, primeiro Tereza Batista ficava toda triste esperando lá no portão – sabe como é, ela já sofreu muitos abandonos – como iria ter a certeza de que a gente iria voltar? Agora, no entanto, ela já sabe que a gente volta, e então, do portão ela retorna para a varanda e fica cuidando da casa.
Mas há as ocasiões especiais, quando, ao invés de pegar a bolsa dos cachorros, a Urda pega a mochila dela, o que significa que vamos sair de carro. Como sou um ser já bem ajuizado, espero para ver se ela pega também a chave do carro antes de sair correndo, mas o Zorrilho, aquele pingo de cachorro, mal vê ela pegar a mochila e já sai fazendo a maior barulheira em direção à garagem, seguido da Tereza Batista aos pulos. É só ela abrir as portas do carro e nós entramos correndo, e cada um sabe o seu lugar bem direitinho: Tereza e Zorrilho no banco de traz, e eu no banco do carona. Como quase sempre a nossa vizinha Maria Antônia vai junto nesses passeios, é claro que ela me dá o melhor colo que um cachorro pode ambicionar, e até abre a janela do carro para o vento trazer todos os cheiros lá de fora para dentro.
Vamos a muitos lugares, nesses passeios, como à praça do centro da Enseada, na agropecuária, na praia de Fora, tomar banho com a tia Lourdes na Barra do Aririú e em tantos lugares que nem dá para contar aqui. No Natal, fomos todos juntos, numa noite, ao Natal Luz da cidade de São José e nos divertimos muito! Noutro dia também passamos um dia inteirinho na praia do Raul Longo e o cachorrinho dele, o Chiquinho, que é uma nisca de nada, ficou apaixonado pela Tereza Batista! Nós quatro brincamos o dia inteirinho naquela praia maravilhosa que se chama Sambaqui e não houve nenhum problema – sabe como é, os homens daqui (e também algumas mulheres) tem medo da Tereza, pois no tempo em que ela não tinha dono e vivia na rua ela criou fama de cachorra mordedora. Hoje, no entanto, ela está que é uma lady, como diz a Maria Antônia – só se enfeza quando vê a gente que a maltratava no passado, e é por isso que sai de corrente para passear. A Urda sempre diz que a Tereza é uma academia de ginástica, pois ela se exercita muito segurando a corrente da grandona.
E então passeamos por aí de carro, e a Urda e a Maria Antônia nos avisam quando vamos passar por algum cachorro para a gente latir, e também latimos muito num gado que vive num lindo pasto aqui perto – é assim, de um lado da estrada há o grande pasto, e do outro lado é a praia, e o carro fica parado para a gente poder latir bastante naqueles bichões. Claro que nós não iríamos latir para eles fora do carro, né? Há cada boi enorme!!!
Bem, Katty, assim tem sido nossa vida por aqui. Nem contei da Domitila, que é uma gatinha que pensa que é cachorro e anda sempre atrás da gente pela praia, mas isto eu conto outro dia.
Carinhosas lambidas do seu amigo,
Atahualpa.
Sertão da Enseada de Brito, 07 de Março de 2018.
Urda Alice Klueger