Por *Fernando Ringel (@FernandoRingel)
Sabe quando não se pode dizer uma coisa, mas a pessoa dá a entender? No último dia 7, a União Europeia anunciou a análise das propostas da Ucrânia, Geórgia e Moldávia para aderir ao bloco. Todos estes países têm relações históricas com a Rússia, tendo sido, inclusive, parte da União Soviética.
Entretanto, o processo de entrada na União Europeia é complexo. A Croácia, último país aceito, em 2013, levou dez anos até que todas as exigências fossem cumpridas. Na melhor das hipóteses, Ucrânia, Geórgia e Moldávia seriam aceitas em 2032.
Se é assim, este é o momento para a União Europeia abrir este debate? Como agravante, estes países têm territórios separatistas apoiados pela Rússia. Para quem tiver interesse, pesquise sobre Criméia, Abecásia e Transnistria. Se a União Europeia quer colaborar para o fim do conflito, está fazendo errado.
Qual é o recado da Rússia?
Com o maior exército da Europa, a Rússia decidiu mobilizar militares da Chechênia, uma pequena república que tentou se tornar independente no final dos anos 1990. Logo após assumir o poder, Putin deu fim ao conflito armado colocando no poder políticos que cumprem suas ordens, como ocorre em Belarus, antiga Bielorrússia.
Neste contexto, por que levar para a guerra na Ucrânia militares da Chechênia? Só de viagem são 1500 quilômetros! Ora, além destes soldados já terem experiência em guerra, a mensagem é: “eles eram contra a gente e hoje lutam pela Rússia”.
Lições da Bósnia e Alemanha
No último dia 13, a Rússia atacou uma base perto da fronteira com a Polônia, país que tem doado armas e aviões para a Ucrânia. Coincidência? O problema é que a Polônia é membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e, se for atacada, será defendida pelos demais países do grupo. Fica claro que essa situação é um atoleiro.
Se o conflito continuar, existe o caminho da Bósnia, que após três anos conquistou a independência da Iugoslávia. O preço foi ter seu território cheio de zonas militares, de população sérvia, onde os próprios bósnios não podem entrar. Para a Ucrânia, a saída mais natural seria como ocorreu na Alemanha.
Há um muro no fim do túnel?
Dia 27, o presidente ucraniano afirmou que a divisão do país é a intenção da Rússia. De fato, agradaria a todos os envolvidos a manutenção da Ucrânia, com território apenas até a região de Kiev, alinhada à Europa, e algo como uma “Ucrânia Oriental”, com capital em Donetsk, região de maioria russa, alinhada com Vladimir Putin. Este novo país não precisaria nem ser anexado à Rússia, desde que siga as diretrizes de Moscou.
Seria uma saída para acabar com a guerra em algumas semanas. Não é o ideal, mas empurraria para o futuro uma saída diplomática. Só para lembrar, a Alemanha foi reunificada depois de 51 anos, e o que poderia se tornar um conflito nuclear foi resolvido sem a necessidade de um tiro de revólver. É por esse tipo de situação que existem Coréia do Norte e Coréia do Sul, que concordaram com o fim das agressões militares, mas oficialmente estão em guerra desde 1950.
De volta para o futuro? Existem alternativas mais drásticas, mas nem sempre eficientes. A principal é a Europa deixar de depender do gás e petróleo russos, o que envolve um investimento imenso, incluindo o desenvolvimento de novas tecnologias, como a popularização dos carros elétricos. Seria um belo impulso ecológico, mas demoraria anos para ser efetivado. Como as pessoas precisam comer e se aquecer hoje, é necessária uma saída mais prática. A crise econômica é um remédio amargo para esse tipo de situação. É só pensar: se o mundo inteiro perde com a guerra, para que isso? Portanto, há luz no fim do túnel e não deve demorar.
Na última terça, 29, a Ucrânia aceitou não entrar na OTAN, assumindo papel de neutralidade na política internacional. A Rússia anunciou a diminuição nos ataques, mas não cumpriu. Depois que o caldo entorna, tudo fica mais complicado. Apesar disso, as negociações têm evoluído. Não é correta a intromissão russa em um país estrangeiro, mas só a ingenuidade faria alguém acreditar em um desfecho diferente nesse conflito. O Vietnã, país pobre pertinho da China, lutou contra tudo e conseguiu seguir seu próprio rumo, ao custo de 16 anos de guerra. O comércio mundial suportaria um conflito com essa duração no coração da Europa?
Como essa guerra não interessa a ninguém, inclusive a você que está vendo tudo encarecer, existe luz no fim do túnel. A questão é o preço que essa aventura vai custar à Ucrânia: país dividido ou aliado incondicional da Rússia. Um passo para trás para no futuro dar dois à frente.
* O jornalista Fernando Ringel é comunicador e professor do curso Produção para Rádio nos Pacotes Sony e Adobe. Ele também tem bacharel em Publicidade e Propaganda.