Por Simone Gadotti Strelow
Como quase tudo nessa vida, o Autismo apareceu de surpresa lá em casa, no final do ano letivo de 2010. A coordenadora pedagógica da escola do meu filho (então com seis anos e no primeiro ano) me chamou para uma conversa, dizendo que ele é extremamente inteligente, mas muito agitado e não consegue permanecer sentado na sala de aula. Isso a preocupa, pois no segundo ano ela achava que ele teria dificuldades, justamente pela falta de atenção e agitação constante. Ela também comenta que não tem como nos dizer ao certo, mas que desconfiava de hiperatividade.
Dia 07 de dezembro de 2010, o veredicto: Brunno é autista leve ou de alta funcionalidade.
Não foi um susto, há muito eu já desconfiava. Aos dois anos e meio, ele cantava músicas de MPB com seu avô e fazia perguntas que raramente vejo crianças até mais velhas fazerem. Aos três anos conhecia todas as letras do alfabeto, já navegava tranquilamente pelo site da Discovery Kids, mas nunca tinha muitos amigos. Ele sempre preferia a companhia segura de um ou outro amiguinho, de preferência com personalidade mais tranqüila, que ele pudesse dominar, ou então, conquistava os adolescentes.
Não era raro vê-lo nas rodinhas da turma do sétimo ano, mesmo estando apenas no primeiro, sendo tratado como igual. A surpresa não veio. Veio o alívio por aquilo ter um nome e um tratamento. Aos poucos conseguimos contornar o déficit social, e hoje ele tem muitos amigos de sua idade, mas mantém uma ou outra característica do autismo. Ainda é super literal, não entende sarcasmo de jeito nenhum, e tem uma sinceridade exagerada.
Nesta mesma semana, em que demos um nome aos sintomas do Brunno, mais um veredicto nos aguardava. Nosso caçula, que nasceu prematuro, tinha uma consulta de rotina, com o neurologista, e neste dia 10 de dezembro de 2010, descobrimos que o Autismo ia ser o assunto mais debatido em nossa casa. Nicolas também tem a síndrome, num grau bem mais elevado que o do mano.
E assim começa nossa viagem pelo Mundo Azul. Se foi difícil? Foi. Claro que foi, principalmente pelo Nicolas, que foi muito mais afetado pelo autismo. Tivemos que deixar o filho idealizado partir e sentir o luto por tudo que o autismo nos tirou, para depois de coração leve e limpo, aceitar que nossas alegrias viriam de pequenas conquistas, que muitas vezes passam batidas em outras famílias.
Aos poucos o Autismo nos mostrou todo um universo desconhecido. Clínicas e mais clínicas, terapeutas, uns mais sérios e éticos que outros, charlatões, e AMIGOS… sim em caixa alta mesmo, porque não tem como passar por esse mundo azul sem reconhecê-los.
Descobrimos que não estamos sozinhos, que há muitas e muitas famílias com os mesmos medos, as mesmas aflições e as mesmas esperanças. Mais pais como nós esperando o tão sonhado ‘papai’ e ‘mamãe’ que o Nicolas ainda não falou.
De tudo que vivemos e aprendemos, fica a certeza que não existe um autista igual ao outro. Aprendemos também que o ser humano é cruel demais, principalmente com o diferente. Que o preconceito dói demais, ainda mais quando vem de pessoas próximas a nós, que o olhar de pena, então… nossa… esse machuca ainda mais.
Mas aprendemos também que essas crianças podem ser como qualquer outra. Meus filhos são sapecas, levados, inteligentes e lindos (sim, eu sou mãe coruja também!!). Hoje a mídia felizmente está falando no assunto. Estamos tendo espaço em rádios, jornais, novelas e principalmente na internet.
O que precisamos cuidar neste aspecto é com os rótulos. Como já disse antes, não há um autista igual ao outro. A personagem Linda, da novela da Globo não existe. Foi ótimo terem abordado o assunto, mas achei um desserviço fazer com que a recuperação dela fosse milagrosa desse jeito. Amor é importante, mas amor não cura! Não basta dar um pote de tinta e pincel, uma visita rápida ao psicólogo e achar que seu filho vai casar no próximo capítulo! É preciso muita, mas muita terapia… muitos e muitos profissionais envolvidos.
E se você amanhã descobrir que seu filho é autista, não se desespere. Seu mundo vai mudar? Vai! Vai ser difícil? Vai sim, mas não é o fim do mundo! Se cerque de pessoas boas. Explique e peça ajuda. Pedir ajuda é essencial!!! Hoje no Brasil temos 2 milhões de autistas, 1 a cada 68 crianças nascem autistas. Estamos vivendo uma epidemia silenciosa, e nossa maior arma é a informação.
Espero que um dia as pessoas possam olhar nossos filhos e verem neles o potencial imenso que eles têm. Que a sociedade como um todo aprenda que o diferente não é ruim. Afinal, nenhum quebra-cabeça se completa com peças iguais.