Nessa semana, o governo federal pediu que Santa Catarina receba 2,5 mil imigrantes venezuelanos. Eles saíram do seu país que vive uma crise humanitária sem precedentes e fazem parte de aproximadamente 40 mil, que fugiram ao Brasil, a grande maioria concentrada em Roraima. O pedido foi feito oficialmente em reunião entre o Ministério do Desenvolvimento Social e a secretaria estadual da Assistência Social, Trabalho e Habitação.
Mas a procuradora do Ministério Público do Trabalho (MPT), Cristiane Sbalqueir, levantou falhas na Medida Provisória n° 820/2018, que dispõe sobre as ações de assistência emergencial para acolhimento de estrangeiros que se refugiam no Brasil para escapar de crises humanitárias em seus países de origem.
“O principal ponto que chama a atenção do MPT é a ausência do desenvolvimento de uma vertente concreta de empregabilidade e de prevenção à vitimização das pessoas em relação a condutas como o trabalho escravo”, destacou ela. A MP foi editada devido ao fluxo migratório no Brasil, oriundo principalmente da Venezuela pela fronteira de Roraima.
De acordo com a procuradora, embora a União foi advertida antes da construção da MP, “não consta nos itens a serem desenvolvidos pela política de acolhimento nada relativo a geração de emprego e renda, nada relativo a prevenção da exploração do trabalho”. Essas falhas foram apontadas por ela na audiência pública da Comissão Mista da MP do Senado Federal, realizada nesta quarta-feira (18).
Ela alertou ainda que as ferramentas legais e institucionais para inserção desses migrantes no mercado de trabalho já existem e precisam apenas ser acionadas e usadas. “Nós temos estruturas constituídas. O Sine – o sistema público de emprego – existe no Brasil de 1975”, lembrou. “Então, o governo não precisa inventar a roda. A roda já está inventada. O que precisa é articular e colocar todas as ofertas de emprego para os migrantes dentro do sistema público, porque, se a gente não fizer isso, está aberto o campo para as ofertas enganosas”, explicou Cristiane Sbalqueiro, que faz parte de grupo especial de procuradores do MPT criado para tratar da questão da empregabilidade dos venezuelanos no Brasil.
Outra preocupação do MPT é em relação as ofertas de empregos. “Infelizmente, a experiência tem mostrado que, a cada duas ofertas de trabalho fora do sistema público para um migrante, uma é para exploração em situação de trabalho degradante ou análogo ao escravo. E nós não podemos querer isso para os migrantes que estão adentrando no nosso país”, declarou a procuradora. Segundo ela, as denúncias já recebidas pelo MPT se concentram nos setores rural, doméstico, da construção civil e do comércio.
A audiência teve também a participação do representante da Organização das Nações Unidas (ONU) no Brasil, Niky Fabiancic, que criticou outros aspectos da MP.
Interiorização – O Ministério Público do Trabalho (MPT) acompanhou, na última semana, a recepção de cerca de 200 venezuelanos transferidos de Roraima para quatro centros de atendimento na capital paulista. Dois procuradores membros do grupo do MPT responsável por esta questão – Janine Rego de Miranda e Gláucio Oliveira – visitaram, nos dias 10 e 11 de abril, os centros Missão Paz (32 venezuelanos); Centro Temporário de Atendimento de São Mateus (129 venezuelanos); Terra Nova (6 venezuelanos); e Centro Temporário de Atendimento de Santo Amaro (30 venezuelanos).
Esse acompanhamento é essencial para que o MPT fiscalize o processo de interiorização dos venezuelanos, de modo a garantir o respeito aos direitos humanos e trabalhistas. Na ocasião, os procuradores promoveram um diálogo com os migrantes e acompanharam a atuação do governo no processo de interiorização.
O grupo especial de procuradores criado para tratar do assunto tem como objetivo garantir que exigências feitas pela instituição estejam sendo cumpridas por todas as partes atuantes no processo – União, estado de Roraima e municípios envolvidos, tal como São Paulo.
Nota técnica – O MPT divulgou, recentemente, nota técnica com o objetivo de proteger os migrantes venezuelanos de situações de abuso no trabalho e promover sua empregabilidade em condições dignas. O documento foi enviado ao Poder Executivo federal.
A nota requer da União providências efetivas para criação e implementação da política pública de empregabilidade aos migrantes e a adoção de medidas de prevenção e repressão ao trabalho escravo e infantil, ao tráfico de pessoas, à discriminação e xenofobia. Segundo a nota, é necessária a adoção urgente de ações de empregabilidade na política de interiorização dos venezuelanos que está sendo desenvolvida pelo governo federal.
O MPT vem acompanhando as medidas adotadas pela União, estado de Roraima e municípios envolvidos e, em caso de desconsideração dos pontos levantados pela instituição, promoverá as medidas judiciais adequadas. A nota cita acordo judicial firmado entre o MPT e a União em 2015, por meio do qual a União se comprometeu a conferir apoio técnico e financeiro à oferta de serviços e políticas para migrantes.
Fonte: Ministério Público do Trabalho (MPT)