Especialistas da América Latina discutiram em SC ações integradas para combater facções criminosas no Brasil

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Especialistas no combate ao crime organizado do País passaram três dias na sede do Ministério Público de SC, em Florianópolis, trocando informações sobre a estrutura e os métodos de atuação das principais facções criminosas no Brasil e da América Latina. O seminário nacional começou a quarta-feira e terminou nesta sexta-feira (11/11/16).

“O conhecimento acerca dos métodos, dinâmica de atuação e estratégia de expansão territorial das facções criminosas é imprescindível para que se possa aplicar e aprimorar as técnicas de inteligência hábeis ao seu enfrentamento. E o estreitamento das relações entre os diversos atores deste processo é fundamental para a engrenagem do conjunto”, explica o Coordenador de Inteligência e Segurança Institucional do Ministério Público de Santa Catarina, Promotor de Justiça Sidney Eloy Dalabrida.

Entre os participantes do seminário, estiveram o Chefe das investigações dos crimes cometidos pelo narcotraficante Pablo Escobar, Promotores de de Justiça do Ministério Público de São Paulo e do Rio de Janeiro, integrantes da Corregedoria da Penitenciária Federal de Mossoró (RN), da Coordenadoria-Geral de Informação e Inteligência Penitenciária Nacional, da Unidade de Sistema de Inteligência de Piauí, da Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática do Rio de Janeiro, da Polícia Militar de São Paulo, Santa Catarina, do Exército Brasileiro e da Secretaria de Justiça e da Segurança Pública catarinenses.

Cada um deles discorreu sobre a sua especialidade no combate ao crime organizado. O Coordenador do núcleo do GAECO em Presidente Prudente (SP), Promotor de Justiça Lincoln Gakiya, discorreu sobre a expansão nacional do PCC, uma das principais facções criminosas do País, e as perspectivas atuais.

Especialista em PCC, Lincoln têm 25 anos de Ministério Público e coordena o núcleo do GAECO há 10 anos. Para ele, seminários como este é fundamental para a troca de experiências e aprendizado para enfrentamento das facções criminosas. “O problema é multiinstitucional. O Ministério Público, Poder Judiciário, sistema penitenciário e as polícias precisam conversar entre si”, avalia.

 
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Na entrevista abaixo, Lincoln fala sobre as principais características de uma organização criminosa, sobre a descriminalização do uso de drogas no país, a corrupção de agentes públicos e a segurança dos integrantes do sistema de justiça que atuam contra as facções criminosas.

O crime organizado no País realmente aumentou ou estamos vando um maior enfrentamento?

Lincoln Gakiya: Na minha opinião está aumentando, além de haver, realmente, um maior enfrentamento. Isso acaba expondo para população, para opinião pública, os tentáculos do crime organizado, mas temos elementos que podem comprovar que, de fato, o crime organizado tem aumentado exponencialmente, infelizmente.

Por quê?

Lincoln: As razões são várias. Creio que a estrutura empresarial de organização criminosa que esse tipo de criminalidade atingiu faz com que essa busca ao lucro, que é o móvel do crime, aumente. E aumenta também a capacidade de eles expandirem seus negócios para outros ramos de atividade.

As instituições estão preparadas para enfrentar as facções criminosas?

Lincoln: Eu posso dizer por São Paulo. O Ministério Público tem atuado de maneira integrada com as Policias Civil e Militar, com a Administração Penitenciária. É muito importante você ter o contato direto com aqueles que fazem o gerenciamento da tutela desses presos. O estado de São Paulo está adequadamente preparado, mas é um trabalho muito grande a ser feito. E quanto ao resto do País, cada Estado tem que fazer sua parte, nas suas organizações, e o mais importante é que haja integração entre os órgãos, entre as instituições.

A integração das instituições é o caminho para enfrentar essas facções?

Lincoln: Sem sombra de dúvida. O problema é multiinstitucional. Temos problemas no âmbito prisional, de segurança pública, no judicial. Na verdade, o combate às organizações criminosas perpassa por todas essas fases, que envolve Ministério Público, Poder Judiciário, sistema penitenciário e as polícias. Essas instituições têm que conversar entre si.

Como se caracteriza uma facção criminosa?

Lincoln: Na verdade, são várias as características. Eu posso citar algumas delas: a estrutura piramidal, o objetivo de lucro, a hierarquia bem definida, a divisão de funções, a compartimentação das informações, a previsão de lucro, obviamente, são várias as características, mas todas elas, no caso das organizações que eu investigo, são fundadas na primeira característica, que é a ausência do poder do estado.

A corrupção facilita o tráfico de drogas? E o tráfico é o que move as facções?

Lincoln: Sem dúvida. Uma das características da organização criminosa é a corrupção de agentes públicos e a infiltração dessas fações nas instituições públicas. O tráfico de drogas hoje é algo que gera uma economia fantástica no mundo inteiro, então, obviamente essas organizações não iam querer ficar fora desse ganha pão.

A descriminalização do uso de drogas no país não seria uma forma de quebrar as facções criminosas?

Lincoln: Eu sou contra a descriminalização. Eu acho que é uma maneira simplicista de se resolver o problema. Nós vamos legalizar e o estado passar a ser um fornecedor. A questão do usuário já está bem definida, é uma questão de saúde pública, ele já não é penalizado criminalmente, é encaminhado para um tratamento. Agora, tem de haver um enfrentamento mais forte do grande traficante, do fornecedor da droga. A gente dá o mesmo tratamento para o tráfico de beira de esquina e para o produtor da droga, para o grande traficante, aquele que faz a compra da droga nos países vizinhos, que faz a distribuição aqui no Brasil. Então, eu acho que precisa aumentar o rigor aonde precisa aumentar, que é no caso do fornecimento e dos grandes traficantes. Mas eu sou contra a descriminalização.

Aumentar o rigor de que forma?

Lincoln: Passaria por uma política inclusive de Estado. O Brasil, no âmbito federal, tem que se fazer respeitar e ser respeitado no nível do Mercosul, como, por exemplo, esses tratados que não são respeitados no sentido da diminuição da área de produção de coca, de produção maconha, como se isso fosse algo cultural. Então, alguns governos passados foram lenientes com essa questão. Os países vizinhos aumentaram a produção de coca, as áreas plantadas, e, obviamente, nós, o Brasil, que somos o segundo distribuidor do mundo, somos um canal pro mundo, fora o que é distribuído aqui dentro. Então, essa questão perpassaria pelo governo federal, pelas relações entre os países vizinhos, por uma política de fortificação da vigilância nas fronteiras e por um trabalho de inteligência, começando nos países vizinhos para identificar os grandes fornecedores e compradores aqui no Brasil. É uma solução que não é simples e depende da interação de vários órgãos.

Como garantir a segurança dos integrantes do sistema de justiça que atuam contra as facções criminosas?

Lincoln: Essa é uma resposta difícil e complexa. Num primeiro momento a atuação tem que ser, quando possível, despersonalizada, tem que ser institucional. Não pode ficar esse Juiz, esse Promotor ou esse Delegado sempre marcado pela atuação às vezes pessoal, não que não deva ser, mas sempre que possível despersonificar a atuação. Que os bandidos saibam que a atuação é da instituição e não das pessoas. Isso seria uma maneira de, talvez, diluir a responsabilidade. A outra, é a formação de grupos, como os GAECOs, são vários colegas no âmbito do Ministério Público e da Polícia que atuam em conjunto, as assinaturas são em conjunto, as decisões são tomadas em conjunto, que dificulta a identificação desse ou daquele agente. E as questões de segurança pessoal. Poderíamos falar, também, da criação de colegiados específicos, não dos que estão aí, para enfrentamento do tema, com uma despersonificação da figura do julgador, do próprio acusador. Essas questões dependem de alteração legal.

Quando o senhor fala da despersonificação, o senhor está falando de Juízes e Promotores de Justiça sem rosto?

Lincoln: Creio que num primeiro momento a criação das varas especializadas seria um grande passo. Na Justiça Federal nós temos as varas de lavagem de dinheiro, de crime organizado. Mas veja, em São Paulo, o maior estado brasileiro em questão de população, nós não temos as varas especializadas em crime organizado. Às vezes um processo contra toda a organização criminosa, o PCC, que tem um âmbito de abrangência no País todo, e até fora do País, corre numa comarca de 25 mil habitantes, com o Juiz e um Promotor em início de carreira. Dessa forma, chega a ser difícil prover a segurança ou evitar que esses agentes públicos não sofram qualquer tipo de pressão, seja ela psicológica ou de ameaça.

 

Fonte: Coordenadoria de Comunicação Social do MPSC