As primeiras referências ao câncer de pulmão surgiram na primeira metade do século XIX, incluindo o trabalho de um médico francês chamado René Laennec, conhecido por ter desenvolvido o principal instrumento de trabalho dos médicos: o estetoscópio. Esse pioneiro da clínica médica moderna, trabalhando no hospital Necker de Paris, procurava relacionar o exame clínico dos pacientes em vida e a história de seus problemas de saúde com achados posteriores de autópsia. Em alguns casos, encontrou tecido estranho nos pulmões de diversos pacientes que não podia ser atribuído à grande praga daquela época: a tuberculose pulmonar.
O câncer de pulmão era pouco descrito na época, sendo mais relacionado com atividades como a mineração no Norte da Europa, onde era conhecido como “bergkrankheit” (mal das montanhas). Na primeira metade do século XX, houve um aumento no número de casos dessa enfermidade, e a possível associação com o hábito de fumar foi levantada por diferentes médicos e, posteriormente, estatísticos.
Isso ressalta duas constatações: a primeira é que não adianta observar números sem entender o que eles significam (é necessário qualificar as quantidades). A segunda enfatiza o papel da observação atenta por profissionais comprometidos com a saúde das pessoas. Aqui cabe uma convocação aos profissionais da saúde: eles não podem se eximir de participar da gestão dos serviços de saúde, cada vez mais sobrecarregados por burocratas e modelos desconectados da assistência.
Após um estudo emblemático conduzido pelo médico inglês Dr. Richard Doll e seu conterrâneo Bradford Hill, a associação entre câncer de pulmão e tabagismo ficou evidente já nos anos 1950.
No Brasil, integrante desde 2005 da Convenção de Controle do Tabaco da Organização Mundial da Saúde, houve uma redução em alguns índices de tabagismo. No entanto, chama a atenção a prevalência do consumo entre adolescentes e jovens, destacando-se outras formas de uso, como o cigarro eletrônico e o narguilé.
Um estudo nacional realizado em 2019, conduzido junto a adolescentes entre treze e dezessete anos, mostrou que o uso de cigarro eletrônico (porta de entrada para o tabagismo crônico) ocorreu em 16% desse público, e cerca de um em cada quatro utilizou narguilé. Estima-se que uma sessão de uma a duas horas de uso do narguilé (em geral compartilhado pelos jovens) equivale a fumar entre cem e cento e cinquenta cigarros.
Em Santa Catarina, esse mesmo estudo mostrou uma prevalência de 20% e 40% no uso de cigarro eletrônico e narguilé, respectivamente, entre os jovens catarinenses. Quanto ao cigarro eletrônico, há evidências científicas consolidadas mostrando que seu uso aumenta em quatro vezes o risco de se tornar um tabagista.
Voltando a atenção às suas consequências, sabe-se que o cigarro reduz a expectativa e a qualidade de vida dos usuários, sendo a causa de diversas patologias e, no caso do câncer, é responsável por uma em cada três mortes por essa doença. Isso inclui não apenas o câncer de pulmão, mas também câncer de cavidade oral, laringe, esôfago, pâncreas, bexiga, entre outros.
Especificamente quanto ao câncer de pulmão, a principal arma na detecção precoce consiste na tomografia com baixa dose de radiação, mas ela deve ser indicada após uma discussão no consultório, a depender da carga tabágica e outros fatores. É importante destacar que, mais do que um exame, a necessidade de acompanhamento clínico regular não deve ser jamais negligenciada, especialmente para quem fuma.
Dr. Cristiano também é Diretor do Centro de Oncologia Unimed Blumenau