Desafios da Vigilância Epidemiológica de Blumenau para evitar que graves doenças avancem

Foto: Marlise Cardoso dos Santos

 

Texto: Claus Jensen | Entrevista e foto: Marlise Cardoso Jensen

Febre amarela, chikungunya, meningite, sífilis, leptospirose, vírus da zika e H1N1, são desafios que Ivonete dos Santos lida diariamente em seu cargo. Eles estão 24 horas de plantão para qualquer doença com características de rápida transmissão. Além disso, ainda enfrentam a burocracia para adquirir medicamentos que precisam de uso imediato para salvar vidas.

A diretora da Vigilância Epidemiológica de Blumenau conversou nesta manhã de quarta-feira (15) com Marlise Cardoso Jensen.

OBlumenauense: Quais as ações que a Vigilância Epidemiológica está empenhada neste momento em Blumenau?

Ivonete dos Santos: É uma pergunta extremamente complexa [risos]. Na Vigilância Epidemiológica nós não podemos parar nunca, trabalhamos 24 horas. São várias doenças e notificações, que se a vigilância não interfere, isso pode se agravar com a população de Blumenau. Exemplo: meningite. Ela não é uma doença só de inverno, nós temos muitos casos neste período (verão) também. Se a Vigilância Epidemiológica não interfere nessa cadeia de transmissibilidade, a população está mais susceptível de ter um número maior de casos confirmados.

Trabalhamos com mais de 58 tipos de doenças com notificações compulsórias. São doenças que os hospitais, ambulatórios e prontos socorros de Blumenau tem que nos avisar de imediato. Algumas tem que ser notificadas na hora via telefone, já que trabalhamos 24 horas, outras no dia seguinte, após o fato. Aqui reunimos os dados dos focos dessas doenças na cidade.

OBlumenauense: Falando em focos, como está a situação da dengue em Blumenau?

Ivonete dos Santos: O ministério da saúde não aceita mais que se fale de dengue, e sim do Aedes aegypti, porque também transmite a chikungunya, que pode deixar sequelas para o resto da vida. Também tem o famigerado zika vírus, que na região está mais tranquilo. Mas no nordeste, as crianças tem nascido com sequelas extremamente severas, que chamamos de microcefalias. Essa também é uma doença de notificação obrigatória. Por isso acompanhamos essas microcefalias em nível de Brasil, porque desde 2015 aumentou em uma proporção absurda devido ao zika vírus.

Em Blumenau, ainda estamos com uma situação extremamente confortável. Nós temos casos de chikungunya, zika vírus e dengue, porque essas pessoas infectadas viajaram para as regiões endêmicas e já vieram doentes para cá. A partir da hora que recebemos a notificação, nós fazemos o PVE, Pesquisa Vetorial Epidemiológica, que envolve um raio de 5 Km da área onde estão essas pessoas doentes. O objetivo é verificar se há focos desse mosquito e tentar barrar a proliferação do aedes aegypti.

OBlumenauense: Apesar das regiões mais atingidas serem no sudeste e centro oeste, há alguma ação para combater a febre amarela em Blumenau?

Ivonete dos Santos: Sim, não só Blumenau, mas toda a região. Temos muitos primatas como o bugio e outros macacos menores, tal qual o sagui. A população tem que entender que não são eles que transmitem a febre amarela para nós, pelo contrário, são muito mais susceptíveis. Esses animais são um alerta de que o mosquito da mata está contaminado com o vírus da febre amarela, e por serem os primeiros da cadeia, acabam sendo picados antes. Quando aparecem mortos, é um grande aviso que vai chegar na população também. Se você analisar epidemiologicamente esses óbitos e números da febre amarela, vai perceber que por enquanto estão centralizados nas regiões agrícolas desses estados.

OBlumenauense: Não há nada que possa ser feito para evitar a chegada desses mosquitos?

Ivonete dos Santos: Esses mosquitos são silvestres, o que significa que estão na mata. Nossa preocupação é se a febre amarela vier para os centros urbanos, contamine o Aedes aegypti, que então pode transmitir a doença.

OBlumenauense: Quais foram as principais demandas atendidas pela Vigilância Epidemiológica em Blumenau no ano de 2016?

Ivonete dos Santos: Desde fevereiro começamos com os casos de gripe H1N1, onde Blumenau foi o município brasileiro que mais registrou óbitos e casos positivos confirmados da doença.Foi um foco muito grande. Sabemos que o vírus está na região, e na hora que tiver uma oportunidade ele vai se manifestar. Por isso é importante ressaltar, que ele não é mais de inverno, porque os primeiros óbitos foram registrados em fevereiro, quando estávamos em pleno calor. Falando sobre a gripe, até o final desse mês teremos novidades sobre a campanha de 2017.

Caxumba – Apesar de não ter sido considerado um surto, mas foram registrados vários casos de caxumba (parotidite) em adolescentes. Essas crianças tomaram a vacina quanto tinham entre 8 a 10 anos, e os jovens que estavam doentes, na faixa de 18 a 19 anos, não estavam recebendo a proteção nessa idade. Tivemos que fazer bloqueios principalmente nas nossas faculdades e escolas com ensino médio, para tentar barrar essa transmissibilidade muito grande da caxumba.

Leptospirose – Também tivemos casos de meningite e a leptospirose, esta última muito associada a enxurradas e enchentes. Mas não é só nestas situações que ela aparece! Temos muitas regiões na cidade com lagoas e onde também há ratos, que transmitem a doença através da urina. Mesmo que a pessoa não tenha se machucado, a leptospira entra pelos poros do corpo.

Sífilis – O aumento na região com mais de mil por cento nos casos de sífilis no ano passado, um dado preocupante, já que é uma doença que deveria estar extinta. Não só em Blumenau, mas em todo País. Isso significa que a população não está se cuidando, principalmente com o uso de preservativos, já que ela é sexualmente transmissível. As gestantes contaminadas também transmitem às crianças. Outro agravante, que em 2017 já está normalizando, é o que chamamos de tratamento de primeira escolha: a penicilina que ainda é a mais eficaz. Nós tivemos em 2015 e 2016 falta do medicamento, porque o ministério da saúde não importou matéria prima para produzí-la.

OBlumenauense: Como está o fornecimento de vacinas por parte do governo?

Ivonete dos Santos: Nós estamos com um problema muito sério de falta de vacinas e soros, desde o final de 2014 e início de 2015, no Brasil inteiro. Nos soros antivenenos, para picadas de escorpiões e cobras por exemplo, somos nós (Vigilância Epidemiológica) que recebemos e enviamos para os quatro hospitais de Blumenau. Se em 2014 você fosse picado por algum desses animais e atendida em um hospital, o soro estava disponível para ser aplicado. Hoje não funciona mais assim. Nós temos que centralizar o medicamento aqui, às vezes é um tratamento só, para daí mandar ao hospital que está precisando e então o Estado nos repor. Além de um retrocesso, é um stress muito grande. Outro exemplo, é que exigem a aplicação da vacina da hepatite e a dupla adulto (dT) para quem trabalha com alimentos. Mas nós não temos. Ou seja, o ministério do trabalho exige, mas o ministério da saúde não dá.