Certos Cães: filme catarinense inspirado em Franz Kafka estreia neste fim de semana

Produção cinematográfica explora linguagem híbrida entre Cinema, Teatro e outras formas de arte.

O ator Silvio José da Luz é o protagonista do filme Certos Cães. Foto: Luís Brusque.

Por Talita Garcia

Estreia no fim de semana, em duas sessões gratuitas, o média-metragem Certos Cães (33 min), produzido e gravado em Brusque e Botuverá. No sábado (15/05/21), a exibição terá início às 20h, no canal youtube.com/griofilmes, e no domingo (16), às 18h, no mesmo local. A primeira sessão será seguida de um bate papo online entre o ator Silvio José da Luz e o diretor Ricardo Weschenfelder, e a última, de uma conversa com a equipe criativa do filme. O projeto cinematográfico foi viabilizado pela Lei de Emergência Cultural Aldir Blanc (Lei no 14.017/2020) no município de Brusque.

Certos Cães é originalmente uma peça teatral inspirada no conto Investigações de um cão (1931), de Franz Kafka, e na trajetória pessoal e artística de Silvio José da Luz. Contemplada pelo Prêmio Herbert Holetz, a montagem estreou em 2018, em Blumenau, sob a direção de Roberto Morauer, que também é autor do texto dramatúrgico.

O palco do Teatro do Cescb, em Brusque, foi o principal set de filmagens de Certos Cães. Foto: Luís Brusque.

A peça teatral foi adaptada para roteiro de cinema por Weschenfelder, que elegeu o Teatro do Cescb, em Brusque, como principal set de filmagens do trabalho, gravado em abril deste ano. Mas antes que o espectador suponha que assistirá a um “teatro filmado”, ele explica: “Buscamos criar uma obra híbrida entre Cinema e Teatro, e que procura dialogar com a Música, a Literatura, as Artes Plásticas. Um objeto estranho na economia das imagens atuais: meio teatro, meio cinema, meio performance e inclassificável de rótulos”.

Produção cinematográfica brusquense é inspirada no conto Investigações de um cão, de Franz Kafka. Foto: Luís Brusque.

O roteiro, tal como o conto kafkiano, apresenta um “homem-cão” como protagonista e narrador: “Ele é uma mistura de humano e cão. Sentindo-se derrotado, desiludido e descartável, devido aos maus tratos e a exclusão social, adquire, ao longo do tempo, fisionomia e natureza caninas. Mostramos de forma alegórica essa metamorfose”, revela Weschenfelder. “Essa personagem passa a refletir sobre a vida, a existência, a arte e a liberdade, quase sempre sob o olhar vigilante e a interferência coercitiva de seu adestrador, que representa o Estado, a religião ou o mercado”, adianta o diretor. “O horror que Kafka viu na sociedade entre duas grandes guerras reverbera em tempos de pandemia”, complementa.

Expressionismo: roteiro, cenário, figurino, iluminação e outros aspectos de Certos Cães foram influenciados pelo movimento artístico que há um século atingia seu auge. Foto: Luís Brusque.

Referências estéticas

O Expressionismo alemão – que há um século, nos anos de 1920, atingia seu auge em Berlim – é a principal referência estética impregnada em Certos Cães. “Os filmes expressionistas do pós-guerra buscavam abordar experiências humanas pessoais e subjetivas, a partir de sets pouco realistas, ângulos profundos e sombras marcantes, para intensificar a atmosfera das cenas”, comenta o cineasta.

Ícone do cinema alemão, a ficção científica Metrópolis (1927) influenciou a cenografia que Luciano Mafra assinou para a produção brusquense. “O homem-cão habita o subsolo, a camada mais subterrânea e oprimida da cidade, como os operários em Metrópolis”, elucida Weschenfelder. No cenário, um painel confeccionado pela artista plástica Silvia Teske faz alusão à pintura expressionista, com traços fortes e grossas camadas de tinta preta. “Esse painel representa a arte, o sonho e a liberdade de pensamento”, afirma.

Uma vez que remete ao quadro Os Retirantes (1944), de Cândido Portinari – pintor brasileiro de estilo expressionista, o figurino criado por Denise da Luz amplia as referências do filme às mazelas sociais do país e à luta pela sobrevivência em meio a dificuldades que vão além da condição financeira.

Item presente no espetáculo teatral e repaginado na versão audiovisual, a máscara que por vezes cobre parte do rosto do homem-cão pode evocar diferentes significados, conforme indica Weschenfelder: “Ela transmite imediatamente a ideia de uma focinheira canina, mas pode ser associada à pandemia, às narrativas apocalípticas da literatura e do cinema, bem como ao cerceamento à liberdade de expressão”.

Já a fotografia, em preto e branco, tem como fonte o Cinema Noir da década de 1940 – reconhecidamente condicionado pelo Expressionismo. “Também nessa fase o cinema se apropriou de muita sombra, luz demarcada e fumaça, além de ângulos de câmera não convencionais”, observa o diretor, que contou com o iluminador Giba de Oliveira para ambientar o universo de Certos Cães através das câmeras.

A equipe criativa do trabalho conta ainda com o músico João Minatti, na trilha sonora, que estimulou a atuação e até os movimentos de câmera. A música é o gatilho que transporta o homem-cão para outro momento de sua vida, quando então o enredo lança mão do teatro de sombras produzido por César Rossi para conduzir o espectador pelas lembranças da personagem.

Sinopse

Refugiado no subsolo da cidade, o homem-cão se deixa devorar por inquietudes e perturbações sobre a condição humana, as relações sociais, o alimento, o poder. Entre sonhos e memórias, ainda guarda a vívida lembrança dos cães aéreos. Eles são alento em meio à selvageria e podem ser a sua única esperança de salvar-se dela. Adaptação audiovisual da peça teatral homônima, Certos Cães é uma obra híbrida entre Teatro, Cinema e outras formas de expressão artística.

Ficha Técnica
Produção: Griô Filmes
Atuação: Silvio José da Luz
Participação Especial: João Pedro Serpa da Luz
Texto Original e Direção Teatral: Roberto Morauer
Adaptação e Direção Audiovisual: Ricardo Weschenfelder
Direção de Produção: Alessandro Vieira
Cenografia: Luciano Mafra
Iluminação: Giba de Oliveira
Trilha Sonora: João Minatti
Mixagem e Masterização de Trilha Sonora: Demis Kohler
Edição e Finalização: Carlos Alexandre Martins
Figurino: Denise da Luz
Câmeras: Jaques Rangel e Douglas Eduardo Russi
Som Direto: Diego Dambrowski e Jairo Adriano
Maquiagem: Jéssica Tavares
Assessoria de Imprensa: Talita Garcia
Design Gráfico: Roner Lucas Becker da Luz
Teatro de Sombras: Cesar Augusto Rossi
Painel: Silvia Teske
Assistente de Iluminação: Edson Luiz Albino Junior (Juninho)
Assistente de Figurino: Leandro Cardoso
Costureira de Figurino: Maria Antunes
Composição e Interpretação da Música “A Vida”: Fernando Dácio Francisco
Still: Luís Brusque

Estreia do filme de média-metragem Certos Cães
Datas e horários: Sábado (15), às 20h | Domingo (16), às 18h
Assista em www.youtube.com/griofilmes
Duração: 33 minutos.
Classificação indicativa: 14 anos
Acesso gratuito