Alto índice de cesáreas no país revela medo de parto normal

 

 

 

Por Jaqueline Soares

Pesquisa aponta que grupo de mulheres que já tiveram uma cesárea é quem mais tem medo do parto normal; especialista pondera que deve haver mais informação e consequente liberdade de escolha da gestante

Seja por indicação médica, preferência pessoal ou alguma emergência, é notável que o índice de cirurgias cesáreas possui um número alto no Brasil. O país ocupa a segunda posição no mundo em número de cesarianas. Enquanto isso, a Organização Mundial da Saúde (OMS) determinou que até 15% fosse um percentual recomendado. Entretanto as brasileiras que dão à luz por cesárea chegam a 55%.

Boa parte das cesarianas não possui uma determinação médica efetivamente necessária, e que incluam fatores de risco que justifiquem a cirurgia. Entretanto, em muitas localidades, faltam condições propícias à realização do parto normal. Além disso existem fatores que influenciam como a indisponibilidade do médico, o comodismo em ter uma data certa de parto e a durabilidade do procedimento que é muito curta, quando comparada com um parto normal.

Com o objetivo de investigar a causa deste alto índice que preocupa a OMS, o portal Trocando Fraldas elaborou um estudo com 7 mil mulheres pelo Brasil, entre elas 3,5 mil grávidas, para identificar a razão pela qual mulheres, mesmo tendo total direito de escolha, se submetem à uma cirurgia que poderia ser evitada.

O levantamento elimina a hipótese de uma possível influência dos médicos para que o parto seja uma cesárea, isso porque 84% das mulheres afirmaram que o obstetra nunca indicou que uma cesariana seria a melhor escolha. Mesmo assim, o grupo das mulheres que já tiveram um parto cesárea foi a maioria quando apontaram que a indicação partiu do médico.

Na pesquisa, 53% de todas as mulheres entrevistadas estão preocupadas de o Brasil ser um país com um alto número de partos cesáreas. Contraditoriamente, 45% culpam o desejo da própria mulher pelo excesso de cesáreas no Brasil, apenas 17% o médico e 14% o sistema de saúde brasileiro. Entre os grupos de quem já teve uma cesárea e parto normal, as mulheres que tiveram parto normal foram a maioria, com 65%, e apontaram que o índice de cesáreas no Brasil é preocupante. Enquanto isso, 39% de mulheres que passaram por uma cesariana afirmaram que isso é uma preocupação.

Uma margem considerável de 61% demonstrou ter medo do parto normal. Enquanto 86% das gestantes que já tiveram parto normal gostariam de ter de novo, 47% das que tiveram cesárea responderam que pensam em ter parto normal em outra gravidez. O grupo de mulheres que já teve cesárea foi quem demonstrou mais medo do parto normal, com 69%. Estados como Amapá e Roraima estão no topo entre os que possuem mais mulheres com medo do parto normal.

Neste mês de junho, na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), o Projeto de Lei 435/2019, da deputada Janaina Paschoal (PSL), que garante à gestante a possibilidade de optar pelo parto cesariano, foi aprovado por dez votos a dois na Comissão de Constituição, Justiça e Redação, e deve ir para votação em plenário nesta quarta-feira (26). A medida garante que a grávida opte pelo parto cesariano, a partir da trigésima nona semana de gestação, bem como a analgesia, mesmo quando escolhido o parto normal.

Para a ginecologista e obstetra Dra. Maíra de La Rocque, que também está se especializando em medicina fetal, a falta de informação das mulheres sobre os benefícios e riscos de cada procedimento, além da baixa remuneração dos planos de saúde para os médicos credenciados, podem ser fatores que desencadeiam o alto número de cesáreas no Brasil.

“Muitas mulheres têm a ideia do parto normal que é passada pela mídia. Isso faz com que elas não saibam os reais riscos e benefícios e não tenham capacidade de julgamento baseado em evidências científicas. A parte fundamental desse processo é a busca por informações e, acima de tudo, o respeito pelo desejo dela em escolher a via de parto. Se, após saber de riscos e benefícios, a mulher ainda escolher pela cesariana, acredito que é um direito e deve ser respeitado”, pontua. “O que não podemos aceitar mais são falsas indicações, enganação e o aproveitamento de um momento de fragilidade para manipulação em prol de comodismo médico”.